CDTS ENTREVISTA elabora série de entrevistas sobre contemplados do Programa Inova Fiocruz Covid-19

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Para abrir a sequência de conversas sobre as propostas do CDTS/Fiocruz contempladas no Programa Inova Fiocruz Covid-19, convidamos Monique Trugilho. A pesquisadora, especialista em proteômica, atua em parceria com quatro grupos de pesquisas que produzem importantes contribuições ao combate à Covid-19. E foi com o projeto “Aspirado traqueal como fonte de biomarcadores de gravidade para prognóstico clínico na Covid-19” que a cientista conquistou investimento para os estudos sobre o tema. 

Ao longo de sua carreira você tem feito contribuições importantes na área de dengue e outras arboviroses. Como surgiu a ideia de submeter um projeto para o Programa Inova  Fiocruz Covid-19?

Antes mesmo deste edital, e assim que a pandemia se instalou no Brasil, nosso grupo mapeou as frentes de trabalho nas quais cada cientista poderia atuar. Minha expertise envolve aplicar as tecnologias proteômicas* no entendimento dos mecanismos fisiopatológicos de diferentes doenças, usando principalmente amostras clínicas. E assim a ideia surgiu, de forma natural a complementar ao que já fazíamos nas pesquisas de arboviroses.

Além de sua equipe, o projeto contemplado conta com outros colaboradores e parceiros?

Sim, claro! Uma pesquisa deste tipo nunca é desenvolvida por um único cientista. Em nosso grupo temos pesquisadores de diferentes especialidades: bioquímicos, imunologistas e virologistas, além de médicos infectologistas e outros vários profissionais atuando na linha de frente da organização e execução da seleção dos pacientes e coleta das amostras. E eu tenho a sorte de trabalhar transitando entre quatro grupos de pesquisas que estão fazendo contribuições importantes no combate à Covid-19. Minha atuação é no CDTS, na qual trabalho junto ao Thiago Moreno, mas conto também com os cientistas Richard Valente e Ana Gisele Neves-Ferreira do Laboratório de Toxinologia (IOC/Fiocruz); Patrícia Bozza do Laboratório de Imunofarmacologia (IOC/Fiocruz); e Fernando Bozza do INI/Fiocruz. Além destes, atuam também no projeto Eugenio Hottz, da Universidade Federal de Juiz de Fora e, Camila Ribeiro, do CDTS/Fiocruz.

Essas multiparcerias são características da ciência translacional que faz com que o nosso projeto se encaixe no edital “Geração de Conhecimento”, dentro do Programa Inova Fiocruz Covid-19. A proposta é, através da pesquisa básica tentar preencher as lacunas de conhecimento sobre a Covid-19 e sugerir soluções que possam ser aplicadas no prognóstico e manejo clínico dos pacientes. 

"O nosso fio condutor é a pergunta:

‘Quais são as biomoléculas envolvidas

na progressão desta doença?’.”

É urgente a busca por estratégias de controle da pandemia de Covid-19 que impactem diretamente em benefício à sociedade. Como seu projeto pretende atender a essa necessidade? 

Primeiramente, contribuindo no entendimento molecular do que acontece nesta doença a nível molecular. No caso da Covid-19, ainda não sabemos quais mecanismos moleculares são determinantes de adoecimento, gravidade ou óbito. Temos a expectativa de conseguir identificar e entender os processos biológicos nos quadros mais graves. Se conseguirmos avançar nas pesquisas, talvez possamos nortear o manejo destes pacientes e, quem sabe, evitar o óbito.

Escolhemos investigar amostras respiratórias porque o pulmão é o órgão primariamente atacado pelo novo coronavírus. As amostras, por consequência, podem refletir sobre os mecanismos moleculares envolvidos na doença. São muitas lacunas a serem preenchidas e chegar a estas respostas não é simples. Contudo, munidos de conhecimento, o impacto pode ser enorme.

Trabalhamos junto a outras frentes de pesquisa que se dedicam a perguntas como: “Por que os quadros clínicos são tão diferentes?” “Por que um paciente tem alta em 10 dias e outro em 2 meses?” “O que faz uma pessoa de 90 anos evoluir para cura e um jovem de 30, com o mesmo tratamento, falecer?”. Esses são exemplos de investigações destinadas a entender melhor a Covid-19. O nosso fio condutor é a pergunta: “Quais são as biomoléculas envolvidas na progressão desta doença?”. 

No seu projeto você pretende avaliar o perfil proteico de amostras respiratórias de aspirado traqueal de pacientes graves com Covid-19. Quais são os objetivos dessa investigação e qual abordagem metodológica será utilizada?

O objetivo é isolar e mapear as proteínas contidas nas amostras de aspirado traqueal que possam estar relacionadas aos quadros mais graves da doença. Em outras palavras, vamos descrever o proteoma** do aspirado traqueal na Covid-19.

“Essa pesquisa pode nos ajudar a entender os mecanismos fisiopatológicos e de gravidade da COVID-19, além de ter potencial translacional quando pretendemos aplicar as descobertas a serem feitas para tentar melhorar o manejo dos pacientes a partir de um prognóstico.”

Achamos estas amostras superinteressantes porque, além delas serem comumente utilizadas em doenças respiratórias para diagnóstico, por exemplo, trata-se de uma amostra rica em biomoléculas (como é o caso das proteínas) e ainda pouco explorada por abordagens ômicas, responsáveis por mapear biomoléculas em larga escala. Quando se conhece pouco da doença, a aplicação destas abordagens é ideal, pois são discovery-driven, ou seja, baseadas em descobertas.

A proteômica é assim. Ela dará as primeiras pistas do que pode estar acontecendo em âmbito molecular na infecção pelo SARS-CoV-2. E o proteoma do aspirado traqueal é como se fosse uma assinatura molecular daquele momento clínico do paciente. 

Portanto, vamos usar as tecnologias proteômicas para identificar o perfil proteico do aspirado traqueal de cada paciente. E isto será feito por espectrometria de massas, que é uma ferramenta poderosa, pois não só identifica todas as proteínas em larga escala, mas também é possível quantificá-las. 

Munidos disto, usaremos programas computacionais para identificar padrões moleculares que sinalizem as diferenças entre os pacientes que tiveram alta hospitalar daqueles que, infelizmente, foram a óbito. 

Você acredita que através da mesma abordagem metodológica seria possível identificar biomarcadores de prognóstico em fases mais precoces da doença? 

Com esta metodologia, é possível sim identificar proteínas candidatas a biomarcadores. Nossas amostras foram coletadas de pacientes intubados. Portanto, aqui todos os casos são graves. E através do estudo prospectivo sabemos quando foram feitas as coletas, quanto tempo cada paciente ficou internado e os graus de severidade. 

E assim, podemos agrupar as amostras de acordo com o tempo de internação, progressão da doença e desfecho clínico, para quantificá-las diferencialmente e fazer comparações. Se conseguirmos distinguir o perfil proteico de cada grupo biológico (precoces versus tardios; altas versus óbitos - por exemplo) é possível identificar as proteínas que indiquem, nas fases mais precoces, como um paciente pode evoluir e/ou seus diferentes estados de gravidade. 

“Neste projeto, destinamos 70% do recurso contemplado para pagamento de um bolsista de pós-doutorado por 2 anos. Pretendemos selecionar um profissional com experiência em nanocromatografia e espectrometria de massas, que será imediatamente integrado à esta pesquisa sobre a Covid-19.”

Essa pesquisa pode nos ajudar a entender os mecanismos fisiopatológicos e de gravidade da Covid-19, além de ter potencial translacional quando pretendemos aplicar as descobertas a serem feitas para tentar melhorar o manejo dos pacientes a partir de um prognóstico. Cabe ressaltar que, para validar um biomarcador é preciso ir além das técnicas proteômicas, e utilizar outras metodologias em uma coorte maior de pacientes. E o estudo proteômico é o excelente começo. 

De que forma o recurso do projeto contemplado será utilizado?

Este projeto conta com a infraestrutura dos Laboratórios de Toxinologia e Imunofarmacologia do IOC/Fiocruz, além do apoio das Plataformas Tecnológicas PDTIS/Fiocruz e da empresa AGILENT de espectrometria de massas. Com este suporte tecnológico, apenas uma pequena fração do recurso será destinada à compra de reagentes.

O foco maior é o pagamento de um profissional pesquisador. Formar e manter recursos humanos é um desafio na pesquisa científica brasileira. Neste projeto, destinamos 70% do recurso contemplado para pagamento de um bolsista de pós-doutorado por 2 anos. Pretendemos selecionar um profissional com experiência em nanocromatografia e espectrometria de massas, que será imediatamente integrado à esta pesquisa sobre a Covid-19.

Entendemos como nossa missão permanente a formação e especialização de recursos humanos que possam atender prontamente as demandas emergenciais de saúde pública em nosso país.

*Proteômica é o campo da Bioquímica que estuda as proteínas (ou proteoma) em larga escala. A principal técnica empregada na proteômica é a espectrometria de massas. A espectrometria de massas é uma técnica analítica capaz de detectar e identificar moléculas pela determinação da relação massa/carga. 

**Proteoma é o conjunto de proteínas expressas em uma célula, tecido ou organismo, a partir das informações contidas no genoma.

Entrevista por Fernanda Fonseca e Gardênia Vargas

Equipe de Comunicação do CDTS

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